I
Agora que já não consigo mais tampar a boca do vulcão em final de ciclo, eu saio de cima do topo e corro da explosão de fogo entre lavas e chamas que primeiro sobe ao céu, saundando-o, e depois desce à terra para realizar toda a sua varredura astral.
Desçam!, ó lavas em chamas, e queima toda a cidade que te ignorou! Derrube casas, varre ruas juntos com a iluminação elétrica, e entre nas redes de esgoto para acabar com tudo o que há de mais podre e fétido!
Nade nos rios, mate os peixes já apodrecidos, aniquile as algas e volte para a avenida onde os humanos se encontram desesperados. Abraze e lance chama nos corações dos homens endurecidos; entre no meio das pernas das mulheres prostituídas, e nos bancos em que os corruptos depositam seus roubos e faça uma fornalha verdadeiramente santa!
Queime tudo! Não deixe nada que mereça ser impune! Seja maior que a destruição de Sodoma e Gomorra! Fique na História dos maiores estragos da Natureza! E depois, ah, e depois cesse, para que a chuva regida por Vênus caia e limpe toda a sujeira...
II
Eu olhei para a face mais maravilhosa do Verbo!
E somente quem passa por esta grande experiência,
pode ter o agnosticismo por Filosofia,
e o Deísmo como crença!
Senhores, sabe muito pouco a ciência que odeia o Mistério
e não compreende os símbolos místicos...
Eu mesmo passei por nove anos construindo a mesma casa,
para depois concluí-la e abrir as portas.
Vejam agora, o piso é liso, o carpete é Árabe, e as cortinas, indianas...
O que era apenas areia, cimento e tijolos são agora parecidos com o pão, o vinho e a planta, aquela da Amazônia...
Foram nove anos, Senhores! a jornada cujo início foi batizada por luzes e que me conduziu para um deserto de sofrimento e jejum.
Eu venho de uma espiritualidade demasiadamente forte...
III
De vez em quando eu preciso descer nas profundezas inferiores
e tomar um trago do veneno que oferece o próprio Diabo
para não esquecer que sou filho do Pecado
e que a minha condição é categoricamente humana....
São os senhores que brigam de espada.
São os desbravadores que abrem os terrenos à base de foice,
e os agricutores que trabalham na enxada.
O índio não quer ser cacique à toa.
E para cada mulher bonita e sensual
há em volta sete homens.
Beba pois, e torne-te um malandro!
Levanta a tua guarda e sorria!
Os pobres e miseráveis não usam a inteligência nem a força...
Tenha o que é teu,
Seja o que você é,
Para depois, ter o pleno direito de levantar louvores
e dar a Deus o que é de Deus, oh santo guerreiro...
Glauber da Rocha.
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Oh Senhor Deus do Universo Inteiro; agradeço-te por me deixar nascer nesta Terra de falsos profetas, pastores mercenários e lobos vestidos de peles de cordeiro...
Sim, ó Senhor do Universo, sou muito grato por viver numa Terra de políticos corruptos, de empresários gananciosos, de gente assassina e cruel. Do contrário, oh Senhor, jamais teria tido a chance de morrer a cada dia de sede e de fome, jogado nos corredores da Santa Casa como um moribundo órfão de pai mãe e padrinhos...
Oh, Jesus, agradeço por poder presenciar a arrogância e o egocentrismo da maioria das pessoas, metidas em seus carros de luxos e casrões com mil cercas elétricas e doze mil doberman's furiosos.
Agradeço tudo isto, oh Senhor
Hoje, Senhor, a lua nasceu bonita.
Glauber da Rocha.
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A literatura séria me despreza,
não sou digno de desatar as chinelas de Guimarães Rosa.
Ainda que a produnfidade de meus poemas
atingisse o céu da boca deles,
não me vomitariam.
Eu sou um desses que pega a estrada,
que renega absolutamente a vida em torno do lucro,
o vagabundo que ri faceiramente da cara do patrão,
a voz de uma geração de jovens descontentes...
Chega de falar em versos. Vamos para a prosa, para um ano atrás. Era véspera de Carnaval. Eu cheguei em casa mais revoltado do que nunca. Falei: eu vou-me embora. Para onde?, perguntaram-me com olhos aflitos. Não sei. Eu vou para o mundo. E para o mundo fui, com uma pequena mochila nas costas.
É muito difícil para um poeta filósofo manter o equilibrio aqui no Brasil. O venveno da Filosofia quando entra na veia humana mata toda a inocência.
Você acaba sabendo que a maioria das coisas que você aprendeu na vida não é verdade, que a escola te enganou, que a igreja te enganou, que a televisão te enganou, e ainda você tem que saber superar tudo isso.
Você aprende que seu país é um país sub-desenvolvido, enquanto que hora ou outra um país desenvolvido é mais pobre que o nosso.
Você aprende que tem que ter desapego material e com isso todo mundo passa em cima de você e leva tudo o que é teu.
Você aprende dizer amém enquanto quem te ensinou fala não vem que não tem...
Eu coloquei a mochila nas costas sim, e saí sem rumo, em direção ao Mundo, e apenas pela manhã, quando o sol raiou, e já cansado de tanto andar pelo encostamento da rodovia, pararam para me dar carona.
Entrei no carro, olhei para o sol, e disse: a minha alegria brilha agora mais que os raios da aurora...
Senti a liberdade, fiz novos amigos, tomei banho de rio, dormi em praças, pulei Carnaval, transei, fumei, curti.Você acaba sabendo que a maioria das coisas que você aprendeu na vida não é verdade, que a escola te enganou, que a igreja te enganou, que a televisão te enganou, e ainda você tem que saber superar tudo isso.
Você aprende que seu país é um país sub-desenvolvido, enquanto que hora ou outra um país desenvolvido é mais pobre que o nosso.
Você aprende que tem que ter desapego material e com isso todo mundo passa em cima de você e leva tudo o que é teu.
Você aprende dizer amém enquanto quem te ensinou fala não vem que não tem...
Eu coloquei a mochila nas costas sim, e saí sem rumo, em direção ao Mundo, e apenas pela manhã, quando o sol raiou, e já cansado de tanto andar pelo encostamento da rodovia, pararam para me dar carona.
Entrei no carro, olhei para o sol, e disse: a minha alegria brilha agora mais que os raios da aurora...
Guimarães Rosa jamais teria feito isto.
Machado de Assis nem pensar.
Bukovisky quase.
Kerouac sim.
Rimbaud, extrapolou: atravessou a França à pé, alcançou o mar da Àfrica, foi e voltou.
Por que voltou?Para passar raiva, atenuar seu desprezo pelos fracos. Coisa que não suportou, e voltou para a África, para nunca mais voltar...
E por que eu voltei?!
Agora vivo que nem um Beckett.
Agora vivo que nem um Joyce.
Ando de um lado para outro, tentando me adaptar...
Peso na balança: há mais contras do que prós.
Lá tem a estrada, e tem o verde, e tem os rios, e tem as mocinhas inocentes.
Aqui só tem conversa fiada.
Na rodovia, se um homem querer lhe matar, é só matá-lo: quem vai te acusar?
Já aqui o melhor é morrer...
Deus do céu, como queria ser um homem equilibrado!
Ter ganâncias, querer ser rico à todo jeito, comprar carro importado!
Não ter o mínimo de reflexão sobre a verdade.
Essas verdades que de tanto ser repetidas, acabaram se fixando.
Se fixando como as viseiras sendo colocadas nos burros...
Jesus Cristo, beba um trago do vinho no gargalho,
seja meu amigo e fica bêbado uma vez comigo,
diga que o Senhor não é nenhum mágico,
que prefere dar a vida dura a seu filhos...
Seja franco e direto
Fala que seu caminho é de pedras e espinhos...
Corta! Corta! Corta!
Corta o ritmo da poesia.Veja a cena. Mãe e filhos em volta, na frente da merda da tevê. Chega o filho. Bêbado. E diz, estou indo embora. Para onde, meu filho? Para o Mundo, responde ele. E vai. Vai embora para o Mundo. Então, alguém pergunta: para onde foi o teu filho? A mãe responde: para o Mundo...
Glauber da Rocha.
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