A Literatura Brasileira na Blogosfera 3 - Fabrício Carpinejar.


* Para ler a postagem anterior deste assunto "A Literatura Brasileira na Blogosfera", vá em "Literatura na Blogosfera 2 - Ana Maria Gonçalves."


De todos os escritores que falam sobre a experiência que tiveram com a blogosfera, o que mais me impressionou de maneira positiva foi Fabrício Carpinejar. Ao contrário de muitos, que adoram reclamar da falta de leitores e principalmente de dinheiro – sim, literatura não dá dinheiro nem leitores, o que ela dá é um pouco de dinheiro (e isso se o escritor tiver muita, mas muita sorte mesmo) e um pouco de leitores (aqui o mesmo procede) – ele, Fabrício Carpinejar, apenas relatou de maneira realista mas poética o que é a blogosfera para o escritor numa carta que ele escreveu para O Estado de São Paulo.
Eu gostaria de cometer o pecado de transpô-la por inteira aqui, mas ante à tentação, resisto: não posso dar ao leitor tudo de mão beijada. A carta – digo carta porque o texto leva o título de “Epístola aos Blogueiros”, mas poderia ser chamado crônica, ou conto, se quiser – fala exatamente como é a blogosfera para o escritor. E, assim como Paulo falava para os líderes das comunidades primitivas da cristandade – líderes este que ele formou, com a ajuda de Cristo, segundo a Bíblia – Fabrício passa uma mensagem de fé, onde a perseverança é exaltada.
Para Fabrício, o blog é a verdadeira prova para um escritor. Quer saber se você realmente tem vocação para a Literatura? Use o blog enquanto meio de divulgação de sua arte. Se no fim das contas você não conseguir nada com ele, e continuar escrevendo, parabéns: a sua vocação é essa mesma, a de escrever. Pois, o blog, para o escritor, é a sua preparação. Ou melhor: é o seu “Quarenta dias no Deserto”. Veja bem: quarenta dias no deserto, e não o Calvário. Pois, é somente depois do deserto que vem o Calvário, assim como é somente depois do Calvário que vem a Glória. Em outras palavras: quer ser ainda escritor?
Tudo leva a crer que, para um escritor é melhor o Cálvario que o Deserto: no primeiro ao menos há uma multidão em volta. Já no segundo, não há ninguém. O escritor monta o blog, recebe uma injeção de ânimo maior do que os prêmios em certos concursos, acredita que essa ferramenta foi feita para ele, capricha, dá o melhor, revisa e revisa, crente de que agora sim a fama chegará. Mas, posta um texto, posta outro, espera por um comentário, e passa um mês, e passa outro, e nada! É a solidão completa. A vontade de desistir. A fraqueza ganhando proporção. O Davi que virou Golias. O Golias que fica muito maior do que Davi.
Aqui, o escritor pode ter mais de dez anos de escrita, mais de dez anos sonhando com a carreira sólida enquanto escritor: se ele não nasceu para isso, irá desistir. E, se não desistir, ao menos aprende que o escritor deve escrever meramente pelo prazer da escrita, nada mais. Se quem escreve para ser famoso, se alguém escreve para ser rico, é aqui que ele saberá qual é o verdadeiro sentido da literatura. E a sua regra: escreva, sem esperar nada em troca. O resto, é literatura, ou melhor: conseqüência. Ou melhor, o Calvário.
Sim, porque depois da solidão, da angústia do anonimato, vem a evidência para quem não desiste, para quem melhora, para quem revê. E na evidência, impossível é agradar a todos. Nem Cristo que é Cristo conseguiu tal proeza. Então, vem a humilhação, a injustiça, a zombaria, os cuspes, os acoites. As críticas, sim as críticas. Difícil é aceitar as críticas para quem não passou pelo deserto. Fabrício sofrê-las-á. Ninguém está imune, inclusive ele. Pois, o seu convencionalismo e o seu dogmatismo pode até agradar a geração de críticos atual, que vê o poeta metafísico como o poeta dos poetas. Mas não agradará o céptico, o niilista, o sujeito que fica com raiva diante de alguém que tem tanta certeza de que o Paraíso existe, e que há um Senhor regendo todas as coisas.
Aliás, é incrível como essa geração de críticos literários prestam um culto sagrado à Metafísica. Quem faz isso reza, não pensa. Todo e qualquer filósofo sabe muito bem que a Metafísica não foi feita para admirá-la, mas para colocá-la à prova. Metafísica é tortura. E outra: os críticos literários desta geração precisam começar a entender que o conhecimento metafísico não é o saber dos saberes. Eles olham para Heidegger e dizem: nossa, que mistério!, e logo o colocam acima de alguém que inventou a internet, por exemplo. Deus do céu, que povo kantiano anterior a Kant!
O homem não é apenas metafísico: é social, é erótico, é lúdico, é trabalhador, e etc, e etc. Há muita moral num pagão que o metafísico sonha. Você verá que Caeiros não era Mestre à toa, inclusive de seu próprio criador, um metafísico por excelência: enquanto Caeiros, pagão, vivia em harmonia consigo mesmo e com a Natureza, numa felicidade e beatitude fora do comum, Fernando Pessoa foi um homem isolado, triste, de poucos amores e poucos amigos. Portanto, críticos desta geração, é bom parar com essa história de colocar os poetas metafísicos no altar: sejam pois inteligentes, Deus do Céu!
Outro tipo de crítica que Fabrício pode vir a sofrer é quanto ao caráter auto-biográfico de sua obra. A matéria de sua poesia é a vida dele, no fim das contas. É pelo menos o que predomina. A memória e seu fluxo são as seivas de seus poemas, o seu verbo. Fica nítida a impressão de que ele, seu pai e sua mãe vivem as normas celestiais aqui na terra. Paira sobre eles uma espiritualidade espiritista, onde o amor, a caridade, a fé, a humildade são tratados com um respeito demasiadamente cauteloso: violar essas dimensões é uma falta grave, uma transgressão demasiadamente cruel, coisa de gente que não tem religião. Se alguém afirmar que a religião só atrapalha a vida de um homem, eles são obrigados a protestar contra, ainda que Fabrício seja obrigado a ficar sempre no último lugar da fila e suportar calado a ordem do cobrador de ônibus de que é preciso dar mais passos à frente, mesmo que não os haja...
Fora o conteúdo, agora Carpinejar é imune à crítica. Seu estilo, isto é, forma, é algo conquistado com muito esmero. Certa vez E. Levinás disse que para um texto ficar bom é preciso afiá-lo como se afia uma lâmina ao ponto de fazê-la sumir, desaparecer. Carpinejar fala que para um poema nascer é preciso: “desbastar o poema para que só fique o essencial. O verso é como uma escultura: o rosto está lá dentro, sendo preciso para descobri-lo extraindo pedra.”
Poesia não é colocar uma frase debaixo da outra, sabe Fabrício. E isso ele deve ter aprendido muito bem com seu pai e sua mãe, grande poeta e grande poetiza. O pai de Fabrício é nada mais nada menos que Carlos Nejar. E sua mãe, Maria Carpi. Da junção desses dois sobrenomes que surgiu o seu: Carpinejar. Foi ele mesmo quem fez essa união. Ver o pai e a mãe juntos é a vontade de todo bom filho...
No seu trabalho poético, Fabrício procura sempre a metáfora, seja na poesia, seja na crônica. É sempre a parábola indo em direção à frase metafórica, sem esperar o décimo quarto verso para fechar com chave de ouro. Bom poeta, bom cronista. Das crônicas, vale a pena ler “Do lado ou de Frente?”, que fala sobre o amor, sobre casais em restaurantes. Diz ele: restaurante é um observatório do amor.”
Outra boa crônica é a Inundação, cujo tema é a morte. Fora dos trilhos, uma crônica de memórias de sua infância. Boca mole, crônica que fala do relacionamento homem mulher. Um carro casado, outra crônica que fala de relacionamento, mas com ênfase na intimidade entre os casais. Dois canudos, onde ele defende uma tese por qual motivo nós, seres inteligentes, sempre tomamos refrigerante com dois canudos e nunca um apenas, que basta. E há também as crônicas que ele dedica ao seu filho Vicente. Já as poesias, são muitas. Do livro “As solas do Sol”, onde o poeta-personagem chama-se Avalor, há três no seu blog: “Primeira Colina – poema 8” Oitava colina – poema 1” e “Nona Colina – poema 3.
Há também, em seu blog, um poema do livro de poesias “Um terno de pássaros ao sul”, outro do livro “Terceira sede”; do “Biografias de uma árvore”, e do livro “Cinco Marias.” É acessar o blog do poeta Carpinejar e conferir a Carpintanejaria poética desde poeta ora chamado de Colecionador de Silêncios, ora de Poeta da Essencialidade, de Puxador de Sinos, de Novo Velho Poeta e entre tantos outros nomes.

0 comentários:



Postar um comentário